Aventurar-se nos mágicos caminhos da palavra encantada, abrindo o coração à visão do invisível, ao gesto da escuta, ao olhar que se maravilha, ao pensamento mágico e imaginativo, ao universo brincante, à diversidade cultural dos povos é o convite deste projeto de trabalho e vida.

sábado, 19 de setembro de 2009

Intenção

Hoje na aula uma das alunas perguntou se para escolher o conto o contador deve se referenciar em sua vontade ou nas necessidades do ouvinte ( não  foram exatamente estas as palavras utilizadas, mas é como lembro-me da questão.... desculpe)
Penso que os caminhos podem ser vários.
Tem momentos em que  a sua vontade, o seu desejo,  a sua conexão com certas histórias  e certos temas, impulsionam sua escolha;  noutros momentos também acontece do mundo trazer demandas;
mas  também há  horas em que são as histórias que afirmam sua vontade e desejo de ser contadas. 
Este movimento  de mão dupla em que o ser segue detrminado em buca de sua meta, de seu destino, mas também recebe com flexibilidade o que o rio da vida lhe traz,  está presente nos contos.
Em "Fátima , a Fiandeira", vemos como ela vai sendo conduzida pelas águas do mar  ao encontro de seu destino, sua realização. "Em Balan, e seu Destino", é êle quem segue direto e reto com o propósito de acordar seu destino  que dorme o deixando na miséria.
A todo instante caminhamos por estas águas de mãos duplas....
Acho então que sempre passa por uma escuta interna, uma conexão profunda consigo mesmo, o outro, o mundo, os contos....
Como disse uma das alunas, é importante que você goste da história que vai contar. Sim, este gosto, alegria, prazer é essencial, penso. Mas também é interessante pensar que às vezes um " amor" pode acontecer à primeira vista e às vezes pode vir aos bocadinhos, à medida em que a relação vai se tecendo.
 De qualquer modo sinto que a conexão ou "sinergia"  - bela palavra que uma aluna usou - entre contador e conto é fundamental. Por isto gosto de trabalhar nas aulas com as lembranças e reminiscências da vida: pois quando brotam vêm carregadas de uma verdade, uma unidade uma inteireza,  que emocionam.  Quando evocam suas lembranças, quando a narrativa brota da experiência vivida - terreno em que o contador de histórias toma seu assento - o olho brilha, o gesto se faz gracioso,  o corpo se faz presente. Nestes intantes mágicos de reminiscências a "intenção e presença",  estes elementos que tanto  buscamos aprimorar no exercício cênico e da vida,  de algum modo se revelam  por outros caminhos. Não que a técnica e o exercício não sejam importantes, mas esta conexão com sua história, sua vida, vida , suas raízes... é vital, é um modo de também entrar em conexão com este estado de presença e verdade, que me parece fundamental ao ato de contar histórias.

 Mas a questão  dá pano para manga. E como creio que as perguntas  ou as demandas que vem do mundo estão trazendo questões importantes  para que eu mesma refleta, pare e pense, ouvindo verdadeiramente,  após a aula a pergunta ficou em meu coração.

Então lembrei-me dos contadores de histórias que se revelaram  ao longo de meu caminho:
Jacó quer contar histórias para mudar o mundo, tornar as pessoas mais felizes, alegres....
Sherazade deseja salvar as mulheres do reino que vão sendo mortas uma a uma pelo sultão...
Mãe dos Contos, precisa salvar o bebê que carrega no ventre da violência de seu marido...
Há também quem conte por que as histórias cobram este compromisso de quem com elas se vincula...

Todos têm uma intenção!
Então surge a pergunta: Porque você quer, deseja, almeja contar histórias?
Lembrando que a intenção também não precias ser cristalizada. A medida que caminha, descobre, redescobre, metamorfoseia,  suas intenções. Aqui pode ser uma, lá outra.

 Mas também podemos pensar que contar histórias é uma relação presencial, que envolve o contator, o ouvinte, o conto. É um ato de sutil e profunda escuta:  o ouvinte me escuta, eu escuto o ouvinte; por mim o ouvinte escuta o conto que escutei antes de contar e escuto enquanto conto. Revivido, o conto também se faz vívido de quem conta e quem escuta....

 e assim caminha pelos tempos...

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